Ode à Erato

"χαλεπὰ τὰ καλά" [Nada bonito sem luta.] (Platão)

Um ode à Erato, musa diretriz da vida e do amor,
descendente da Mnimosis e dona dos lavores 
                                                                                                                mais belos rapsodiais.
Não ouço mais os aedos da filha do Crônida.
Erato calou-se dos seus lavores belos
aos ouvidos dos grandes e célebres rapsodos
"Donde vem seus cantos belos que o silêncio
se ouve agora na sua boca fechada?"
Há mais tristeza nesses tempos
em que Erato aprisionada em
apaixonadas redes dos pretendentes 
                                                                                             da filha do Crônida.

Bravo guerreiro, este, que desafiara
os mais nobres deuses ao aprisionar
o aedo da filha da Memória para si.
Feras e pestes, a raiva dos deuses sobre
o corajoso Aqueu pairá sem falta.
Alvedrio, ouça, querido aqueu,
para que os seus músculos descanse
                                                                                                           no leito da deusa Afrodite;
sede ardil entre os homens e os deuses,
conquiste a confiança do Senhor do Olimpo,
se quiseres desposar a Musa, filha de
Mnimosine e Zeus, Senhor do Olimpo e 
                                                                                                    descendente de Titã.

Porém, não permitas nunca que o aedo se cale
na boca do poeta que da Musa espera o canto.
Com Erato o aedo é mais belo e áureo
como o mais puro amor da Pandemônia.
Vá, bravo aqueu, aprisione eros em suas
corajosas mãos e inspira a filha da Memória
a cantar mais belos sussurros aos rapsodos
                                                                                                        do mundo sem falta.

Ana Luiza Pereira
Escrito por volta dos anos 2014.

Pesadelo

A noite estava escura, um verdadeiro breu. No céu não tinha estrelas e nem a lua para alumiar, apenas as luzes dos postes clareavam o meu caminho. 

Já estava na minha rua. Minha casa estava logo ali à frente. Comecei a brincar comigo mesma enquanto andava reto, mochila à frente, sandália nos pés, relógio no pulso.

Na outra esquina saiu alguém, um homem vestindo casaco largo com uma listra verde claro grossa no meio de duas brancas, calça jeans claro, tênis escuro, cabelo castanho bagunçado e bigode no rosto. Nunca tinha visto aquele homem sem equilíbrio ao andar, mas ele me cheirava a perigo.

Tentei apertar meu passo, já estava no meio da rua para chegar em casa, mas acho que não saí do lugar. Via aquele homem vir em minha direção e o meu desespero aumentava. Ouvi um carro atrás de mim e fiz sinal para parar.

Graças a Deus, o golf prata parou. Era Zane, uma conhecida minha que dirigia, e dizia: "Entra rápido!". A porta detrás do banco do motorista, estava aberta e me joguei ali fechando logo a porta. Tinham mais duas ali, todas mulheres e todas conhecidas. Ela acelerou e ele também, mas ao perceber que me perderia ele puxou uma arma da calça e começou a atirar.

"Obrigada!" - dizia antes de acordar e ver rostos de anjos nas sombras. Será que morri? Olho para o lado e meus irmãos estavam ali dividindo o colchão comigo, respirando e vivos. Respiro aliviada. Ainda não morri, apenas sofri o susto da morte de alguém. E volto a dormir.

Ana Luiza Pereira

Vulcão

Sou um vulcão
Adormecido pelas friezas do dia-a-dia
Mas em constante perigo de erupção
de lava que lava a ferida

Sou constante raiva
Constante perda
Constante queda
Constante dádiva

Adormecer é meu mecanismo de não machucar
não sofrer
não ferir
não gerir
não perder
não chorar

A lava corrói dentro de mim querendo sair em forma de palavras
em forma de raiva
em forma de lágrimas
de forma incisiva

Mantenho-me quieta
parada
fechada
concreta

Por dentro há torpor
há ódio
há o decompor
de um choro melódico

Tudo isso é lava
vívida e remexida dentro do vulcão
Vulcão que sou eu
E o que sinto no meu coração

Ana Luiza Pereira

Conto dos irmãos

Era uma vez, três filhos de um mesmo pai e uma mesma mãe, cujas características de cada eram bem particulares:

A primogênita era uma amazona, guerreira cunhada no fogo e brasa no código das amazonas que perdeu sua cabeça e coração para um humano qualquer que a fez sofrer.

O segundo, o líder, cuja liderança jamais exerceu. Escondia-se na decisão de outrém e hoje tem dificuldades de liderar seus filhos.

A terceira, a sábia. Pouco se sabe sobre ela, mas dizem que aprendeu com seus irmãos o que deve ou não fazer. Contam as lendas que sua sabedoria é acompanhada de uma língua afiada e sincera, capaz de fazer chorar quem não souber ouvir a verdade.

Mesmo sendo irmãos, cada um tinha sua própria história, seu próprio caminho seguido:

A amazona, maior guerreira que esta cidade já viu, não soube vencer suas próprias batalhas interiores e particulares. Apaixonou-se por um homem comum e a sua inflência o transformou em um grande cavaleiro em batalhas. Contudo, um homem não é um cavaleiro enquanto não seguir o código de cavalaria, tornando-se apenas um arsenal humano. Por não seguir nenhuma vez o código, o coração da amazona se despedaçou.

O líder sempre teve seus instintos. Suas ações falavam mais que as palavras de incentivo que pronunciava. Contudo, tudo desmoronou quando pregava aquilo que não praticava; a verdade veio à tona e tudo o que restou ao líder foi a decisão de fazer a coisa certa. Desde então, uma parte de quem ele foi ainda vive e briga, de vez em quando, com a parte que se esconde na liderança de outrém.

A sábia, por sua vez, é eremita. Sabe da dor que pode causar e guarda muito para si. Reclusa em seu mundo, ela chora pela dor de guardar aquilo que a faz mal, mas se sentiria pior em ver que fez outros sofrerem pela verdade até então não dita. Não sabe controlar o tom de sua voz e nem a agressividade da sua língua, por isso, é sempre mal-interpretada. Prefere sempre a reclusão e a dor que a própria verdade dita e escancarada, mesmo sabendo das consequências que teria para si.

(Esta história ainda não tem um final claro, então a partir daqui serão suposições de uma autora em delírio de escrita:)

Mesmo com todas as diferenças e com todos os tabus, os irmãos ainda continuam unidos e continuarão mesmo com todas as falhas. Brigas? Sempre. Quais irmãos não brigam ao discordar com o outro? Mas o amor prevalece apesar da dor de cada um. As histórias podem ser diferentes, mas culminam no final do "e foram felizes para sempre", juntos, como irmãos.

Ana Luiza Pereira
Texto escrito em algum momento do ano passado.

Apagão

Um dia ensolarado do final do mês de maio. Um dia qualquer até que, de repente, uma sombra cobriu os céus e o que era calor se tornou frio.

Pessoas que estavam na rua, entraram em casa para trocar suas regatas e pegar seus casacos. Não entendiam como o tempo havia mudado, apenas o fizeram para passar mais um tempo na rua.

Obviamente, havia aquelas pessoa que, ao virar o tempo, pegaram os seus edredons e ficaram na sala de suas casas para ver filme. Cada um por si e tudo na mais santa paz.

De repente, um estrondo se ouviu não se sabe de onde e tudo se apagou. Sem luz, as pessoas que estavam em seus casulos de edredom tiveram que sair forçadamente em busca de luz. Enquanto isso, as pessoas nas ruas se aglomeraram com medo do frio e da escuridão. Em pouco tempo, se estabelece a comunicação.

A comunicação interpessoal há muito tempo esquecida e substituída por tecnologia. Engraçado como foi necessário ter medo do frio e do escuro para que houvesse comunicação. O medo é, de fato, o maior motivador de todos tanto para que façamos algo quanto para nos refugiarmos em crisálidas humanas. E, então, quem você seria nesse apagão?

Ana Luiza Pereira
Texto escrito em algum momento do ano passado.

...

Dumbledore me ensinou a nunca ter pena dos mortos, mas dos vivos.
Mas, o que acontece quando você não deixa os mortos irem?
Ou quando você vive num paradoxo?
"Você não tem motivos para estar assim."
É, eu não tenho.
Mas não sou um ser racional para ter motivos plausíveis.
Vivo num paradoxo constante 
de querer me livrar do meu drama 
quando isso machuca ou preocupa demais alguém
e, ao mesmo tempo, não conseguir.
Porque é meu,
Porque sou eu:
A pessoa mais impulsiva e ignorante que conheço.
A rastejante que quer atenção, mas se fecha quando tem atenção demais.
O que eu quero?
Quero me resolver e parar de chorar.
Sentir menos de mim.
Quero agir e não só por impulso.
Mas esses são desejos de quem?
Sigo ferida e machucada sem saber o que ou quem me feriu.
Não quero falar disso, mas quero que passe logo,
porque eu ainda desejo ser feliz.

Ana Luiza Pereira
Texto escrito em algum momento do ano passado.

O colapso do meu corpo

Meu corpo tem desejo
Desejo de por para fora tudo que minha mente guarda
Minha mente tão consciente guarda no meu coração toda a raiva e dor que meu corpo expele
Meu corpo grita
Meu corpo chora
Meu corpo tão instintivamente primitivo adoece e se cura num ciclo vicioso
Apenas para passar raiva novamente
Minha mente guarda, mas meu corpo fala
Não consigo guardar segredos assim
Meu corpo deseja se sentir bem, calmo e em paz, enquanto a mente guerreia com ela mesma
São duas entidades que almejam coisas diferentes
Equilíbrio não há
É tão tênue a linha que não consigo distinguir
Qual darei ouvidos?
Estou em colapso
Sou um colapso que vive e me arruína
Sou a tenicidade, a linha da loucura
Posso simplesmente gritar com você porque me olhou de forma errada, quem sabe?
Só sei que sou capaz, mas...
Sinceramente?
Nem eu mesma sei o que vou decidir agora
Talvez apenas sentir o colapso do meu corpo

Ana Luiza Pereira
Texto escrito em algum momento do ano passado.

Consciência

A consciência não tem me "estragado".
Vendo hoje coisas sobre mim e o que sinto, percebi:
Escreve aquele que tem desejo de conexão.

O tempo me fez perceber que eu nunca estive só,
Estou rodeada de conexões como um átomo tem prótons, nêutrons e elétrons.
Então, por que sinto?

Sentir demais afeta as conexões.
Acha que eu não sei que tenho uma mãe que reza o terço baixinho pensando na razão que me fez chorar baixinho enquanto dormia?
Um namorado que deseja muito saber e entender o que sinto sento que não há motivos para isso?

O tempo me envelhece e me dá a consciência que preciso de ajuda.
Sou jovem demais para desistir da felicidade que me foi reservada.
Tenho consciência para ir lutar.

Consciência que não tinha,
Que negava e que se culpava por não lutar.
Essa é quem fui.

Outro ensinamento que o tempo me deu: o sucesso não define quem você é, apenas o fracasso.
Você segue em frente depois de um sucesso, porque ele não tem nada a oferecer além da glória.
O fracasso é a sua queda, é o ensinamento que te molda para a glória e, então, você seguirá em frente.

Estou curtindo meu fracasso agora.
Procuro nele o ensinamento que ele tem para me oferecer.
E, um dia, saborearei novamente a glória de um sucesso.

Ana Luiza Pereira
Texto escrito em algum momento do ano passado.

Última peça

Existe um pequeno curta de animação da produtora Mad House chamado "Death Billiards"que culminou em um anime de 12 episódios chamado "Death Parade". Tanto o curta quanto o anime são lindos, explêndidos, caracterizados pelo suspense psicológico. 

Logo que eu vi, ele me marcou; a música de abertura dançante e a catárse de sentimentos da música de encerramento. Lembro da frustração de sempre esperar uma semana para o próximo episódio e de rever e chorar sempre nas mesmas cenas.

Ambos são baseados em lendas sobre "o que acontece quando a gente morre?". Segundo essa versão, você para em um lugar parecido com um bar, onde o barman que te serve é um juiz e precisa escolher, secretamente, baseado na sua essência se sua alma é digna de reencarnar ou cair no vazio. Carregado extremos emocionais de personagens mortos julgados por um juiz aparentemente sem emoções; digo que é essencial a todo o psicólogo ver ambos, pois nada mais é do que análise de personagens no seu pior momento. Afinal, é na morte que descobrimos nossa essência? Quem, de fato, somos? Há teorias que dizem que sim.

Eu sei o que acontece durante a morte e sempre há duas versões: ou você aceita a vida que teve, mesmo com todas as mazelas e todas as alegrias ou você se apega à vida. Não há outra escolha. Os que desejam viver com afinco, ficam aqui até mesmo depois da própria morte e os que aceitam viram lembranças lindas. 

Contanto, por que não aceitar a morte? Ela é a última peça de nossas vidas, o último ato, pois a cortina se fechou para você. O que você vai levar da vida? O fim sempre é dramático, pois é um fim. Mas, será que a sua história merece um recomeço? Toda a vez que vejo de novo e de novo esse anime me pego perguntando isso. Perguntas filosóficas retóricas para tentar responder se eu mesma seria digna de pena. 

Entre tantos eus, não sei qual assumiria na hora de minha morte. Talvez, ninguém veja meu pior lado, apenas eu pense que o vi e o conheço. Talvez, eu não seja digna de pena por ser tão triste e contaminada que as pessoas estão cansadas de darem chance para alguém como eu. Talvez... Eu desperdicei minhas chances? Ainda consigo mudar? Será que sou mesmo a melhor versão de mim? Não... Mas tento. Será que vale tentar? Que isso vai me dar algum crédito no final, alguma felicidade ou esperança? Não sei. Talvez eu só descubra quando for a minha vez de observar a última peça.

Ana Luiza Pereira